10/06/2017

Crítica do filme: 'Nocturama'

Selecionado para alguns festivais pelo mundo e absurdamente sem a mínima chance de ser exibido pelo circuito exibidor brasileiro (talvez pela falta de faro de muitas distribuidoras), exceto em um festival ou outro, o novo e impactante trabalho do excelente cineasta francês Bertrand Bonello (L'Apollonide - Os Amores da Casa de Tolerância), Nocturama, é uma trama cheia de reviravoltas que expõe um confronto de ideias e a falta de limite que pessoas comuns podem ter. O filme é uma grande crítica e expõe argumentos fortes que fala de maneira bem efetiva sobre muitos dos conflitos que assombram países de todo o planeta.

Na trama, conhecemos jovens de diversas etnias que se espalham por uma grande cidade francesa tramando alguma coisa que é revelada aos poucos. Um pouco do cotidiano desses jovens, já no dia da ação, mostram que são pessoas comuns que não geram nem tipo de alerta da polícia. Com a chegada da noite, se reúnem em uma loja de roupas de vários andares, onde é exposto um plano aterrorizante de diversos atentados em lugares previamente estudados. Ao longo dessa noite, muitas questões serão abordadas e o roteiro volta em algo parecido com flashbacks para explicar um pouco de como eles chegaram até esse dia.

Fica claro, por diversos diálogos ao longo das sequências, que os jovens não aguentam viver na sociedade onde vivem, cada um com seu motivo. Isso gera um conflito interno muito grande, um jovem segurança de um edifício com andares desativados, um casal de namorados que tinham a vida toda pela frente, jovens com estruturas emocionais fortes outros nem tanto. Cada um a sua maneira vai deixando de tentar viver a vida como ela é e embarcam em um plano inconsequente. A ficha parece que só cai quando estão confinados em uma loja no fim da noite, discussões e ações, além do conflito de ideias, tomam conta dos diálogos e as incertezas e o medo apontam para todos eles.  Presos em seus próprios pensamentos, o não saber o que fazer dali para frente é uma verdade que eles não conseguem esconder.


Bonello, que dirige e assina o roteiro, mais uma vez volta às telonas com uma trama intrigante e corajosa que expõe uma parte da sociedade em crise de consciência e totalmente inconsequente que muitas vezes encontra refúgio no seu gritar em atitudes que impactam negativamente ao todo levando o medo para outras pessoas. Nocturama é um filme para ser visto, discutido e analisado. Uma aula de cinema desse cineasta francês que possui trabalhos interessantes em sua vasta filmografia.
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Crítica do filme: 'Trapped'

A luta pela sobrevivência é uma questão de persistência. O drama camuflado de thriller Trapped (sem tradução para o Brasil), dirigido Vikramaditya Motwane é uma daquelas histórias inusitadas do cotidiano que acabam ganhando contornos épicos pelas lentes de um bom diretor e um ator protagonista inspirado. O filme, basicamente, fala sobre a sobrevivência, nossos instintos mais humanos e ainda provoca discussões no campo religioso. Diretamente na Índia, esse belo trabalho deixará você com os olhos grudados na tela e ainda imaginando teorias sobre seu final.

Na trama, conhecemos um jovem trabalhador chamado Shaurya (Rajkummar Rao) que após criar coragem consegue se declarar para uma outra jovem que trabalha  em uma empresa com ele. Só que tem um problema, a jovem está com data de casamento marcada com uma outra pessoa (o famoso casamento arranjado). Para tentar continuar com seu grande amor, o protagonista precisa encontrar um lugar para eles morarem em menos de dois dias. Por circunstâncias do destino, consegue um apartamento no último andar de um edifício em fase de espera do alvará para poder ser habitado. Na primeira noite que se muda para lá, quando acorda, Shaurya deixa a porta da rua bater com a chave do lado de fora. Totalmente sozinho, sem ter como sair do apartamento e em um prédio desabitado, ele precisará de muita criatividade e coragem para sobreviver.

O roteiro é cirúrgico. Define muito bem seus arcos, deixando um grande espaço de clímax em seu miolo onde explora as ideias criativas que surgem na cabeça do protagonista para sobreviver. Com apenas uma garrafa de água, ele monta um engenhoso sistema de resgate da água da chuva, faz um estilingue para tentar chamar a atenção dos vizinhos do prédio, mesmo estando a dezenas de metros de altura, precisa definir se vai contra sua religião ou sobrevive comendo um pombo. O filme não perde sua angústia em nenhum instante e isso é algo excelente pois nos conectamos rapidamente com o que acontece em cena tentando encontrar uma solução para o protagonista. Aliado a tudo isso, uma atuação assombrosa do ator Rajkummar Rao, praticamente sozinho em cena durante boa parte do filme, conquista a atenção do público.


Não é possível entender porque tantos poucos filmes indianos chegam no Brasil. Será falta de observação das distribuidoras nacionais? O último filme indiano que entrou no circuito exibidor que lembramos é o espetacular Lunchbox, lançado pela Imovision anos atrás. Um mercado tão influente na indústria como o indiano, com tantos cineastas excelentes, merece cada vez mais ter espaço por aqui. Pena que a maioria dos nossos cinemas que ainda continuam muito norte americanizados. 

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Crítica do filme: 'Como Nossos Pais'

Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos ainda somos os mesmos. Falando sobre a dura rotina impossibilitada do sonhar de uma mulher perto dos quarenta anos que descobre segredos de família e precisa lidar com um casamento em declínio, Como Nossos Pais, novo trabalho da excelente cineasta Laís Bodanzky (Bicho de Sete Cabeças), é um filme que emociona e gera reflexões, aliada a uma impactante atuação da atriz Maria Ribeiro que consegue prender a atenção do público do início ao fim. A Rosa de Laís Bodanzky é tão ou mais forte que a Clara de Kleber Mendonça Filho. É lindo ver dois dos grandes filmes nacionais dos últimos anos terem protagonistas femininas tão marcantes, inesquecíveis.

Na trama, conhecemos Rosa (Maria Ribeiro) uma mulher guerreira que está em crise no casamento com seu marido Dado (Paulo Vilhena), infeliz no emprego que tem e ainda é pega de surpresa com uma notícia atordoante de sua mãe Clarisse (Clarisse Abujamra) que seu pai Homero (Jorge Mautner) na verdade não é seu pai. Essa notícia mexe bastante com a protagonista que passa por uma grande transformação ao longo de todos os 102 minutos de projeção.

Uma super heroína dos nossos tempos, Rosa, precisa conciliar seu tempo com a educação de suas filhas pequenas, tentar ajustes em seu casamento recheado de desconfiança e crise financeira, e uma perturbação inquieta para tentar se encontrar com seu verdadeiro pai que possui um alto cargo do governo. Rosa é o reflexo da força feminina nos dias de hoje. Como para todo ser humano as atitudes, chegam em forma de inconsequência, como a aproximação com o pai de um dos alunos da escola de suas filhas e as explosões em diálogos emocionantes e marcantes com sua mãe. Em uma atuação irrepreensível, Maria Ribeiro dá não só vida a personagem, a torna muito real e, assim, em nossas lembranças mais curtas podemos encontrar uma Rosa em cada esquina.

Na parede da memória, a lembrança é o quadro que dói mais. Epicentro, estopim, da virada na história e quando acontece a virada da personagem, a dúvida de ir ou não atrás do pai biológico chega ao mesmo tempo que memórias com seu pai de criação, o maluco beleza Homero (Jorge Mautner) afloram em seus pensamentos mesmo que entrando em conflito com as atitudes irresponsáveis dele na vida.

Nessa última semana estreou Mulher-Maravilha nos cinemas. Mas a história muito mais marcante, talvez a verdadeira Mulher-Maravilha, a da vida real, que troca a luta com super poderes por tentativas diárias de conseguir esticar as 24 horas do relógio e ser feliz chega aos cinemas brasileiros no final de agosto e você simplesmente não pode perder.


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05/06/2017

Crítica do filme: 'Uma Família de Dois'

A paternidade nos aproxima de um sentimento suave e agridoce de perdão por nossos pais, que agora somos nós. Dirigido pelo cineasta francês Hugo Gélin, em seu segundo longa metragem na carreira, Uma Família de Dois é um drama disfarçado de comédia com muitas reflexões sobre a paternidade e o modo de encarar a vida quando essa toma rumos jamais imaginados. Contando com o carisma e o talento do ator francês Omar Sy (Intocáveis), o filme não deixa de ser um recorte dramático sobre o amor de um pai com sua filha.

Remake do longa metragem mexicano Não Aceitamos Devoluções (2013), Uma Família de Dois conta a história de um inconsequente homem chamado Samuel (Omar Sy), que leva a vida entre um romance e outro trabalhando em um resort em um lugar paradisíaco da França. Certo dia, após passar a noite com duas mulheres dentro de um barco, uma antiga conhecida chamada Kristin (Clémence Poésy) aparece em sua vida trazendo com ela uma criança e dizendo que Samuel é o pai. Após ser surpreendido pela notícia e com o abandono de Kristin da história, Samuel, ao longo dos anos, cresce e amadurece dando o que tem de melhor nessa vida para sua filha. Assim, se muda para Londres e consegue um emprego de dublê, carreira que segue com sucesso até o inesperado retorno da mãe de sua filha a história.

O primeiro arco é bastante corrido, conhecemos Samuel e sua vida desleixada, repleta de noitadas e mulheres. O choque por suas inconsequências constantes chegam ao mesmo tempo que Gloria (a criança abandonada pela mãe) chega em sua vida. O caminho percorrido é intenso e desgastante, precisa arrumar um emprego e uma moradia em uma cidade que não conhece, nesse tempo , como um anjo, surge em sua vida Bernie (Antoine Bertrand) um gerente de elencos famoso que acaba adotando não só o pai mas a pequena criança. O segundo arco mostra a estabilidade e a busca constante de Samuel em busca de notícias de Kristin (por quem tenta se corresponder pelo inbox do facebook), além de explorar como se sente a jovem menina, agora com quase 10 anos, em relação a sua mãe que ela acha ser uma agente secreto (fruto de uma mentirosa ideia de Samuel). No ato a seguir, somos surpreendidos com o retorno da mãe da menina e todo o desenrolar jurídico que acaba sendo consequência quando Kristin resolve se aproximar da filha e ser sua mãe novamente mas aí surpresas sobre a vida são colocadas na mesa e o filme se tornar bastante emocionante com lindas cenas já perto de seu desfecho.


Essa comédia dramática francesa estreia no final de junho no circuito brasileiro, é um recorte sobre a vida e a maneira como precisamos, as vezes, mudar para que as pessoas que amamos, que nos cercam, tenham todas as ferramentas do mundo para se sentir feliz.


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Crítica do filme: 'Quem é Primavera das Neves'

Se o futuro existisse, concreta e individualmente, como algo que pudesse ser discernido por uma mente melhor dotada, talvez o passado não fosse tão sedutor. Dirigido por Jorge Furtado e Ana Luiza Azevedo, Quem é primavera da Neves, essa curiosa fita, navega pelas vertentes da curiosidade e das memórias para contar uma história adormecida nas lembranças de quem a conheceu mas muito viva para explicar também contextos brilhantes da história.

Nesse belo documentário, selecionado para o interessante festival É Tudo Verdade, somos testemunhas do faro e curiosidade do grande diretor brasileiro Jorge Furtado em encontrar Primavera das Neves, tradutora portuguesa que veio para o Brasil fugindo da ditadura em Portugal com seus pais aos nove anos de idade. Primavera é a responsável, entre alguns livros, pela tradução de Alice no País das Maravilhas de Lewis Carroll.

Filha de um anarquista e uma sufragista, amante de música clássica, tentamos entender sua jornada de vida através dos olhos de amigos próximos e do olhar afiado de Furtado. As costuras do roteiro, viajando um pouco sobre a história mas sempre com um olhar atento à vida de Primavera. A narração de Mariana Lima dá um desenvolvimento necessário para que essa bonita saga de descobertas seja melhor compreendida, principalmente com citações de lindos textos que Primavera traduziu ao longo de sua carreira.

Quem é Primavera da Neves estreia no circuito exibidor no meio desse mês de junho, é um recorte curioso de uma imigrante mas que também fala muito sobre nossas origens.  


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04/06/2017

Crítica do filme: 'Mulher-Maravilha'

O coração da mulher, como muitos instrumentos, depende de quem o toca. Criada em 1941 por William Moulton, depois vista na série homônima da década de 70, um dos mais aguardados lançamentos deste ano era sem dúvidas esse blockbuster Mulher-Maravilha. Dirigido pela californiana Patty Jenkins (do impactante Monster: Desejo Assassino) e protagonizado pela belíssima Gal Gadot, o filme foca no feminismo e representativa da personagem título sendo também resgatada sua origem ligada a mitologia grega com citações a deuses poderosos e suas principais qualidades como guerreira.

Na trama, conhecemos uma ilha paradisíaca chamada Temiscira, onde só moram mulheres e possui como sua líder a rainha Hippolyta (Connie Nielsen).  Desde pequena, a jovem e futura amazona princesa Diana (Gal Gadot) queria ser uma guerreira e quando cresce descobre segredos de sua força. Certo dia, um avião cai no mar e Diana salva o único tripulante, o militar e espião Steve Trevor (Chris Pine) de quem escuta que o mundo está em guerra. Após navios inimigos tentarem invadir Temiscira, Diana resolve embarcar em uma viagem rumo à desconhecida humanidade, buscando encerrar o conflito mundial e assim também lutar pelo bem estar de todos ao seu redor.

O filme foca seu primeiro arco na infância e adolescência de Diana, uma princesa de um reino visualmente deslumbrante escondido/protegido do restante da humanidade. Desde a infância, acompanhamos a saga dessa guerreira que a princípio tinha muitas restrições de sua mãe Hippolyta (Connie Nielsen) para que aprendesse as técnicas de luta ensinadas pela General Antiope (Robin Wright). Mesmo guardando segredos sobre sua origem, a Rainha Hippolyta sempre soube que um dia sua filha Diana encontraria seu destino. É quando chega Steve Trevor, um espião envolvido atrás das linhas inimigas que roubou um caderno de anotações importante e está em busca de ajuda para tentar que a guerra tenha vitória das forças aliadas.

O miolo do roteiro explora questões dos homens e suas intermináveis guerras. Os defeitos e qualidades da humanidade são colocadas em xeque pela visão diferenciada e protegida da primeira heroína da DC. Conforme vai descobrindo mais sobre as limitações humanas, Diana vai criando sua própria opinião sobre quem realmente é, e a quem precisa defender. Cenas cômicas entre uma sequência e outra são vistas e dão um toque elegante no choque cultural sofrido pela protagonista.


Em seu arco final, a dor e o sofrimento tomam conta e vão dando a sustentação e maturidade que Diana nunca encontrara, assim como o primeiro amor, assim como sua importância e representatividade feminina.  Mulher-Maravilha é um dos melhores longas metragens feitos pela DC mas sem tanto brilhantismo como alguns clássicos da Marvel. De qualquer forma, essa aventura empolgante cumpre com louvor seu papel de entreter o público com uma boa trama e um roteiro de tirar o fôlego. 
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Crítica do filme: 'Vida'

Claramente inspirado no clássico Alien, Vida, recentemente lançado no circuito brasileiro (onde ficou pouco tempo em cartaz) é uma ficção científica de qualidade transformando uma simples missão espacial em uma mescla de luta pela sobrevivência em paralelo ao senso comum de defesa do planeta. Estimado em 58 Milhões de Dólares, dirigido pelo cineasta sueco Daniel Espinosa (Protegendo o Inimigo) e escrito pelos mesmos roteiristas da sensação de bilheteria do ano passado Deadpool, Paul Wernick e Rhett Reese, o blockbuster apresenta mais lacunas preenchidas sobre sua trama do que a história inesquecível de Ridley Scott. 

Na trama, conhecemos seis astronautas, muitos deles cientistas, que por conta da curiosidade norte americana em continuar explorando o espaço e seus mistérios, são designados para uma missão complexa e cheio de protocolos onde precisam descobrir se realmente há vida inteligente em Marte. Assim, um organismo é encontrado, na verdade coletado, e levado para dentro da estação espacial onde estão para melhor ser analisado. Após dias de comemoração pelas primeiras promissoras descobertas, a instabilidade e o desconhecimento, aliados a impressionante evolução da mostra marciana encontrada, transformam a missão em uma luta pela sobrevivência e escolhas difíceis precisarão ser tomadas.

Como toda conquista norte americana, Nasa principalmente envolvida, os louros e as comemorações chegam logo ao povo americano, tanto que no filme, o nome do organismo ganha o nome de Calvin, em homenagem a uma escola que concorreu com outras dezenas para conquistar esse direito de escolher o nome da espécie que eles mesmo não sabiam direito o que seria e como poderia evoluir. Não chega como uma crítica já que o assunto é abordado de maneira rápida pois o foco do longa fica mesmo no desenrolar da descoberta dos cientistas astronautas, do que o organismo em questão é capaz.

O clima de tensão é grande durante todo o filme. Quando os astronautas perdem o contato com o centro de controle espacial na Terra, os ânimos variam, e decisões precisarão ser tomadas em grande equilíbrio, principalmente pelo fato/risco do organismo marciano conseguir sobreviver e chegar de alguma forma na atmosfera do nosso planeta. Sem pouco conhecer sobre o organismo, um gigantesco quebra cabeça de hipóteses é pensado e o comando da missão vai caindo de colo em colo conforme os acontecimentos. O filme em certo ponto vira um grande jogo de rpg onde temos que torcer pelo personagem que mais achamos qualificado para resolver as complexas dificuldades que são apresentadas muito pela consequência da mutação do organismo encontrado.

Não devemos pensar que Life, no original, é uma cópia de Alien, por mais que existam semelhanças. É um filme bom para quem curte tramas do gênero e com um final que deixa a todos de boca aberta.


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01/06/2017

Crítica do filme: 'Kiki - Os Segredos do Desejo'

Falando sobre casos inusitados e vícios peculiares envolvendo desejos sexuais, o cineasta espanhol Paco León (que também atua no filme) reúne algumas histórias de pessoas e seus dramas, em uma Madri diversificada e cada vez mais cabeça aberta. Kiki - Os Segredos do Desejo, com estreia confirmada para a próxima quinta-feira (08), é quase uma reunião de curtas que tenta explorar o mais profundo possível tabus e o sofrimento dos casais envolvidos. É um remake com pitada europeia do filme de 2014 do cineasta Josh Lawson, A Pequena Morte.

Na trama conhecemos diversas pessoas que possuem em comum algum fato não comum ligado aos seus próprios desejos sexuais. Tem uma esforçada trabalhadora de barraquinha de tiro em parque de diversão que sente tesão quando o marido chora, tem uma mulher que fica com tesão por plantas e quando é assustada por um assalto, tem outra que se excita tocando nas camisas de sedas, o longa explora também o poliamor em um dos retratos. Essa reunião de histórias bem puxadas para a dramédia tenta colocar respostas em diversos tabus que vemos no mundo aqui de fora da telona.

O uso da comédia é um recurso interessante para falar sobre o tema. O problema é que o filme chega a ser meio bobão em algumas partes, tamanho o exagero em algumas cenas mas tenta sempre dar sua profundidade a temas polêmicos que podem aparecer a qualquer esquina. O projeto, que é uma história adaptada de um filme australiano tenta a todo instante mostrar sua própria personalidade e por vezes consegue. O elenco parece que estudou bem o outro filme (o original), seguem perto da linha de atuação do outro set. Não há compromisso seguido de perto do roteiro com os assuntos abordados em muitas situações, tem vezes, onde percebemos os exageros, que há uma comédia forçada até no gestual dos personagens.


Para quem curte das umas boas risadas sem compromisso e consegue desviar dos exageros Kiki - Os Segredos do Desejo pode ser um bom programa pro próximo fim de semana.
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23/05/2017

Crítica do filme: 'O Esquecimento (Im)possível'

Como filmar o que não existe? O que não tem forma, o que falta? Em busca de preencher lacunas sobre seu pai, um militante argentina em época de ditadura, o cineasta argentino Andrés Habegger tenta recriar os caminhos de momentos importantes da vida desse homem que nunca mais viu desde os 09 anos de idade. O Esquecimento (Im)possível , selecionado para o último Festival é Tudo Verdade, é mais um documentário, um retrato, sobre descobertas através do caos da época em que as ditaduras dominavam alguns países.

Os relatos mais profundos chegam através de um antigo diário repleto de detalhes que Andrés ganhou de seu pai, onde o primeiro registrava histórias de seus dias. Assim, uma espécie de trajetória é pré definida, indo atrás de respostas e reviver alguns passos do pai. Alguns parentes que o conheceram, amigos, lugares onde estiveram, gosto pessoais, curiosidades. Um grande quebra cabeça é instaurado e a cada peça conquistada é uma vitória para esse filho em busca de conhecer verdadeiramente quem foi seu pai.

O Esquecimento (Im)possível, aliás, belo nome de filme, desembarca já em seu último ato no Rio de Janeiro, onde as lembranças dolorosas chegam ao seu clímax pois foi onde o pai do protagonista desapareceu. Sem entender como se filma a ausência, as lindas imagens do Rio de Janeiro e todas as ideias de caminhos que o pai pode ter percorrido se chocam com as realidades de documentos que não dizem muito e  apenas uma esperança de resposta através da Comissão da Verdade.


O documentário em questão levanta mais discussões sobre um tema bastante explorado, a época da ditadura militar. Andrés Habegger consegue criar uma perspectiva diferente, sempre com um olhar emocionado se colocando na posição de um filho que vive com lacunas em seu passado. Nada como um bom filme para que as memórias nunca se esqueçam.
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Crítica do filme: 'El Mate'

Quase um teatro filmado, dois atores inspirados, um roteiro que foge do comum e explora as características psicológicas e a vivência dos personagens. El Mate, selecionado para o último Festival de Cinema de Gramado é um filme corajoso e criativo que explora as excentricidades dos personagens em uma sucessão de situações para lá de incomum.

Na trama, um matador de aluguel latino chamado Armando (Fabio Marcoff,) está sozinho em uma casa grande com um homem russo amarrado em uma cadeira. Certa hora, um jovem evangélico chamado Fabio (Bruno Kott) toca a campainha e acaba sendo envolvido nessa curiosa história repleta de situações extremas, assassinatos, filosofias sobre a vida, fé e loucura.

El Mate é basicamente uma clássica comédia de erros com personagens excêntricos. Lembra um pouco algumas ideias vistas em filmes dos irmãos Coen. O roteiro foge do óbvio, se baseia em situações inusitadas que os poucos personagens em cena acabam passando. Com um tom de comédia bem dosado, os arcos são preenchidos com criatividade. Lembranças do passado dos personagens preenchem lacunas de personalidades deixando um ar nostálgico que consequentemente engrossa o caldo dessa história.


O filme ainda não possui data de estreia no Brasil. A interação entre os dois protagonistas em cena é uma das forças dessa curiosa produção que também possui força no roteiro. É um filme que precisa ser aceito, suas ideias fogem do comum.
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21/05/2017

Crítica do filme: 'Horizonte Bonito'

Um líder é um vendedor de esperança. Falando sobre futebol, sonhos, confiança, amizade e esperança, Horizonte Bonito navega nos conflitos e choques de duas gerações, uma de um jovem cheio de desejos a serem realizados e outra de uma vida marcada por acontecimentos polêmicos já com o coração repleto de desesperança. Um dos grandes méritos do cineasta suíço Stefan Jäger, responsável pela direção do longa metragem, é aproveitar muito bem e com simplicidade todos os elementos que contornam a história mas também não deixar de abordar diversas críticas sociais de uma região carente do mundo.

Na trama, conhecemos o carismático Admassu (Henok Tadele), um jovem que vive em uma região bastante carente da África que possui um grande sonho de ser um famoso jogador de futebol e dar orgulho para a comunidade onde vive. Quando descobre que um duvidoso e ranzinza agente de futebol Franz (Stefan Gubser) vai aterrissar em sua cidade, ele resolve bolar um plano mirabolante para ganhar a confiança dele e assim pedir que o ajude a realizar seu grande sonho. Assim, a dupla embarca em uma jornada de autodescoberta onde ambos irão aprender mais sobre a vida.

Muitos jovens no mundo todo tem o sonho de ser um jogador de futebol. Para um de nossos protagonistas é muito mais que isso, o futebol é um misto de esperança e oportunidade. A magia da simplicidade transforma uma bola de meia em momentos de diversão e confraternização com os amigos. Admassu não sabe como é o mundo fora do ligar onde vive, replica sonhos por meio de informações que chegam ao lugar onde mora, muitas vezes incompreendido, se vê sozinho dentro de seus sonhos. O ar leve do filme e quase sempre puxando pra comédia, vira o terreno perfeito para a entrada de um personagem totalmente oposto a Admassu, e, assim, as lições chegam por meio das consequências desse choque  de gerações, vivências e maneiras de ver a vida.

Sem previsão para desembarcar no circuito brasileiro, Horizonte Bonito é um grande achado em meio a ótima cinematografia alemã e suas co-produções. Um filme leve que com bastante maturidade e simplicidade se impõe com críticas sociais que atormentam nosso mundo.


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Crítica do filme: 'Gifted'

Todos estamos matriculados na escola da vida, onde o mestre é o tempo. Dirigido pelo cineasta Marc Webb (do ótimo 500 Dias com Ela), Gifted explora um retrato emocionante de uma família de uma garotinha excepcional e todas as variáveis que a cercam. Bem objetivo em seu roteiro, assinado por Tom Flynn, o longa metragem, sem previsão de estreia no Brasil, conta com apaixonantes atuações de Chris Evans (o Capitão América) e Mckenna Grace.

Na trama, conhecemos a rotina de Frank (Chris Evans) um mecânico de barcos autônomo que largou as salas de aula para se dedicar a criação de sua sobrinha, agora com sete anos, logo após o falecimento trágico de sua única irmã. Ao longo dessa jornada que mudou sua vida radicalmente, Frank percebe que a pequena é super dotada e possui uma mente matemática brilhante levando a jovem a vários conflitos na escola que é matriculada. Quando a direção orienta Frank a matricular Mary em uma escola especializada em aulas com grande eficiência nos estudos avançados de matemática, a avó da criança Evelyn (Lindsay Duncan) aparece na história e resolve lutar pela guarda da jovem prodígio levando a todos a uma batalha judicial.

A objetividade do roteiro chama a atenção. Não se perde em nenhum momento e preenche as lacunas deixadas com muito eficiência por meio de diálogos e surpresas que vão aparecendo ao decorrer dos 101 minutos de projeção. Os arcos são divididos cirurgicamente e entendemos as razões e consequências por meio de muitas sequências de emoções que o filme provoca. O carinho do tio/pai Frank e a visão filosófica que ele tem do mundo servem de aplicação e complemento para a mente super desenvolvida da jovem. Frank quer que ela cresça como uma criança comum, que tenha amigos e desenvolva uma vida em sociedade. Já a avó que entra na história de maneira fervorosa é traz consigo mágoas de um passado constante por conta do conturbado relacionamento com os filhos, principalmente com a mãe da menina.


Os conflitos provocados por essas duas linhas do pensar são apresentados, os personagens se constroem e se desconstroem em sua maneira de pensar, principalmente o protagonista. Os coadjuvantes, a professora de Mary e a vizinha de Frank chegam na trama dando novas óticas e opiniões sobre a situação. Quando o caso vira jurídico, novos argumentos são apresentados rumando para um final emocionante onde o amor e suas variáveis tendem ao infinito.


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